30 janeiro 2007

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LXXI

Interessa-te por tubarões. É melhor, acredita, do que interessarem-se os tubarões por ti.



LXXII

Tudo, em mim, aconteceu demasiadamente tarde. Menos a morte.

do Caderno de Pensamentos do Sr. Anacleto da Cruz

29 janeiro 2007

O LIVRO DOS BONS PRINCÍPIOS ( XXVIII )

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"- Tinhas a ideia de que os teus amigos se moveriam por ti quando chegasse a altura? Tinhas essa ideia, meu idiota? Pois fica sabendo que os teus amigos movem-se apenas por si próprios, percebes?, movem-se por si até que tu tenhas algo para lhes oferecer, só então mexerão o cu por ti, se isso não os desinstalar demasiadamente, meu pedaço de asno. Queres alguém que acredite em ti, alguém que possa, por um momento, respeitar-te, alguém que, num relance, vejas a teu lado? Procura entre quem não te conheça, sonso, entre quem não adivinhe o teu sorriso desengonçado, não tope o teu humor à distância, não tenha convivido ainda com o teu mau hálito. Procura junto de quem não te materialize, junto de quem não esteja presente quando te peidas, quando tiras macacos do nariz e os colas debaixo da cadeira. Busca na net, por exemplo, talvez haja quem te siga, quem se esforce, quem te idealize, quem goste, até descobrir que não, um bocadinho da besta que és..."
Foi com estes pensamentos que Licínio acordou na manhã do dia vinte e seis de Novembro. É certo que o tempo, lá fora, estava bastante merdoso, uma nevrinha capaz de ensombrar o amor próprio de qualquer um.
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Imagine o leitor-autor que pretende escrever um livro e não sabe por onde, nem como, começar. O LIVROS DOS BONS PRINCÍPIOS proporciona-lhe uma vasta gama de princípios para conto, novela ou romance que o leitor-autor poderá seleccionar livremente. Depois terá apenas que escrever o resto demorando o tempo que entender.

28 janeiro 2007

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Os tecnocratas ( caso Esmeralda, posição - voto não porque a lei que temos já prevê tudo isso, mas sou contra a criminalização das mulheres, etc. ) começam a ouvir falar de inteligência emocional.
Acredita-se que andem confusos.

26 janeiro 2007


da série " Sarcófagos Secretos de Leonardo da Vinci "
Escultura encerrada em sarcófago de gesso
e revelada através de raio-x
a. pedro correia
2006

 Posted by Picasa

25 janeiro 2007

RODRIGO



PARABÉNS


sete anos de malandrice
e doçura


24 janeiro 2007

Às minhas "colegas" MRF e Inominável:
Conheço um livro que aborda de forma muito mais dura e crua o assunto do meu último Bom Princípio. Chama-se "Nada mais enganador que o coração", de J. T. Leroy, de quem se pode ler também um blog, especular sobre a sua identidade, etc.
É um livro daqueles que têm bolinha no canto superior direito, absolutamente desaconselhável a pessoas que não suportam literatura sem rodriguinhos, cruel, violenta, no fio da navalha.
A vocês, e aos outros, aconselho vivamente, com a certeza de que vão levar muitos murros no estômago.
Não se trata de um "livro negro". Trata-se, a sério, de um buraco negro, capaz de sugar a inocência e a credulidade de leitores desprevenidos

23 janeiro 2007

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LXIX

Uma cama de madeira não é uma árvore a dormir profundamente.



LXX

Não é líquido que, para fazer uma sopa de pedra, necessites de caldo de lava.


do Caderno de Pensamentos do Sr. Anacleto da Cruz

22 janeiro 2007

O LIVRO DOS BONS PRINCÍPIOS ( XXVI )

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O homem estende uma nota de cinco euros e eu pego nela sem dizer nada. Tenho medo que ele se zangue se eu disser alguma coisa. Ainda me dói aquilo que ele me fez. Ainda me faz impressão a língua dele dentro da minha orelha, a minha pele arranhada pela barba mal feita, o peso dele em cima de mim, mas eu tenho medo de chorar e não choro. O homem disse que me ia dar uma Barbie e era mentira, disse que trocava a Barbie pelas minhas cuecas e era mentira, disse que era a Barbie mais rara do mundo e não era verdade. Agora olha para mim, manda-me vestir as cuecas e dá-me uma palmada no rabo enquanto solta uma gargalhada assustadora. Eu não as quero vestir por cima do sangue que mancha as minhas pernas mas tenho medo de lhe desobedecer. Ele veste-se, abre a porta e diz para eu sair sem que alguém me veja. Diz que me mata se eu contar alguma coisa e que mata os meus pais se eu lhes falar disto. Eu não lhe posso dizer que tenho medo de ficar aqui, com ele, nem que tenho medo de ir para casa, nem que tenho medo de que meus pais descubram o que se passou e ele os mate por isso. Não lhe posso dizer que tenho tanto medo, que nem me consigo mexer.
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sai em fascículos
aqui

18 janeiro 2007

A OFICINA DO AFINADOR

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Sinos Afinados

Chamava-se Goranka. Era croata e chegou a Portugal na sequência da guerra civil que desmembrou a Jugoslávia.
Vinha cheia de energia e de vontade de fazer coisas novas. Pouco a pouco, os fantasmas - os da guerra e outros - começaram a assaltar a sua cabeça. Tinha alturas em que se julgava perseguida, imaginava espiões e aparelhos de escuta, inventava formas de se livrar deles. Às vezes falava nos pais e na sua Croácia. Perguntei-lhe muitas vezes porque não regressava, agora que a paz tinha voltado. Nunca quis.
Soube, hoje, que morreu. A Gora era minha amiga, foi sempre minha amiga. A Gora era, verdadeiramente, amiga dos seus amigos.
Podia ter, por vezes, um som estranho, com interferências dos fantasmas da torre, mas era um sino afinado. Deixou de tocar há dois dias.

17 janeiro 2007


da série " Sarcófagos Secretos de Leonardo da Vinci"
Escultura encerrada em sarcófago de gesso
e revelada através de raio-x
a. pedro correia
2006
 Posted by Picasa

16 janeiro 2007

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LXVII

Quando vires uma árvore a andar, pára. A árvore imitar-te-á.



LXVIII

Levanta-te e caminha. Quando te sentires cansado, senta-te.


do Caderno de Pensamentos do Sr. Anacleto da Cruz

15 janeiro 2007

O LIVRO DOS BONS PRINCÍPIOS (XXIII)

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-Ó mãe, ele tirou um macaco do nariz.
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-Ó mãe, ele é um porco, comeu o macaco.
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-Ó mãe, ele deu-me um pontapé.
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-Ó mãe, ele...
-Cala-te, estúpida. - Disse eu, e dei-lhe outro pontapé.
-Ó mãe, ele chamou-me estúpida - guinchou ela - e deu-me outro pontapé.
Odeio-a. O meu pai diz que ela é a minha nova irmã, mas eu não quero uma nova irmã. Eu já tenho a minha irmã Joana, que vive com a minha mãe verdadeira. Eu fiquei a viver com o meu pai porque em casa da minha mãe não havia espaço para montar a minha pista de automóveis de corrida. Pelo menos foi o que me disseram, mas eu já nem sequer brinco com a pista. Quer dizer, agora tenho uma Playstation que cabia na casa da minha mãe e é a isso que eu chamo uma grande verdade.
A Elsa diz que não quer ser a minha nova mãe porque eu já tenho uma, só quer ser a minha melhor amiga. Mas, então, porque é que a filha dela há-de ser a minha nova irmã? A Elsa dorme com o meu pai mas ainda tem uma casa dela. Não sei para quê, elas passam o tempo todo cá em casa. Ela tenta ser simpática mas não me engana. Vou fazer sete anos daqui a poucos dias, chamo-me joão e ela fala comigo como se eu fosse um bébé. Se o meu pai não se zangasse comigo, eu dizia-lhe que acho que ela é tão parva como a filha dela. Nenhuma delas sabe qual era o maior dinossauro que existiu, nem qual é o vulcão mais poderoso de todos. O meu pai sabe, mas também anda esquisito. Se calhar os adultos, quando se apaixonam, ficam todos parvos. Eu, quando for grande, se me apaixonar,...
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Produção conjunta
O Afinador de Sinos
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12 janeiro 2007

A OFICINA DO AFINADOR

Sinos desafinados

Apareceu, aqui na oficina, um sino desafinadíssimo. O Afinador tentou repará-lo, mas viu-se obrigado a devolvê-lo à procedência, juntamente com o diagnóstico:
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SEM CONSERTO.
ATENDENDO AO SEU TIMBRE, O MELHOR SERÁ FUNDI-LO.
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Tratava-se de um sino sem grande valor histórico. Ostentava uma decoração apimbalhada e um nome em relevo. Lia-se Rui Rio.
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Este Afinador descarta qualquer responsabilidade se, eventualmente, um outro putativo, ou auto-intitulado afinador, o pretender recuperar.
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11 janeiro 2007

A OFICINA DO AFINADOR

Sinos afinados

Gostei imediatamente deste poema de Filipa Leal:

ODE LOUCA

Todos os homens têm o seu rio.
Lamentam-no sentados no interior das casas
de interior e como o poeta que escreve a lápis
apagam a memória com a sua água.
Os rios abandonam os homens que envelhecem
longe da infância, e eles choram
o reflexo absurdo na distância.
Por vezes, enlouquecem os rios, os homens,
os poetas nas palavras repetidas
que buscam uma ode que lhes diga
a textura. Todos procuram o mesmo:
um lugar de água mais limpa
ou um espelho que não lhes negue
a hipótese do reflexo.
O rio sofre mais do que o homem,
o poeta,
porque dele se espera que nos devolva
a imagem de tudo, menos de si próprio.
Todos os rios têm o seu narciso,
mas poucos, muito poucos,
o simples reflexo das suas águas.


De A Cidade Líquida e Outras Texturas
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Desde então as boas críticas têm-se acumulado, como se verifica aqui, na Deriva das Palavras. Estão de parabéns, para além da Filipa, a Deriva Editores, e o António Luís Catarino, pela aposta.

10 janeiro 2007

SARCÓFAGOS SECRETOS DE LEONARDO DA VINCI

a. pedro correia
2006
esculturas de pedra, cerâmica e metal encerradas em blocos de gesso
e reveladas através de placas de raio-x em caixas-de-luz

( peça actualmente exposta no Museu de Física da Universidade de Coimbra )
Posted by Picasa

09 janeiro 2007

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LXV

Os cães ladram. Apesar de não passar uma caravana há muito tempo, os cães não param de ladrar.



LXVI

A estupidez é que te derrota. A tua e a dos outros.

do Caderno de Pensamentos do Sr. Anacleto da Cruz

08 janeiro 2007

O LIVRO DOS BONS PRINCÍPIOS ( XXI )

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Enganei-me no homem que devia matar e isso constituiu um erro definitivo. Se me fosse permitido morrer e regressar, iria comunicar-lhe o meu arrependimento, ainda que tivesse que o visitar no fundo mais fundo dos infernos, porque é possível que ele fosse, como pessoa, bastante pior do que eu.
O outro, aquele que eu pretendia realmente matar, aproveitou o meu erro para desaparecer, mas eu sei que será por pouco tempo. O homem apropriou-se da minha identidade, usa o meu nome, a minha data de nascimento, a minha morada, o meu número de bilhete de identidade. Por causa dele estou cercado de dívidas que nunca contraí, perdi os bens que possuía, ando foragido, existem mandatos de captura passados no nome que era o meu, é procurada a pessoa que sou eu.
Tudo piorou, no entanto, quando comecei, também, a ser perseguido por bandidos e traficantes a quem ele, passando-se por mim, enganou. Foi um desses que matei por engano e, ainda que eu estivesse disposto a eliminar o homem que me tem destruído a vida, não estava preparado para me converter num assassino. Agora, entre todos os crimes pelos quais sou procurado, existe um que foi realmente cometido por mim. Não quero, com isto, dizer que se tivesse morto o tipo certo não teria igualmente cometido um crime, quero apenas afirmar que não teria tido outra escolha.
Eu sei que parece um pouco confuso, mas deixem-me contar-vos a história desde o princípio: …
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Imagine o leitor-autor que pretende escrever um livro e não sabe por onde, nem como, começar. O LIVROS DOS BONS PRINCÍPIOS proporciona-lhe uma vasta gama de princípios para conto, novela ou romance que o leitor-autor poderá seleccionar livremente. Depois terá apenas que escrever o resto demorando o tempo que entender.
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Segundas-feiras aqui
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RESPOSTAS AO POST ANTERIOR:

Vejam aqui. A segunda escultura é igualmente de E. Chillida e situa-se em Bilbao.

03 janeiro 2007

DUAS ESCULTURAS

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O André, n'O Afinador, outros por mail, tentaram adivinhar os percursos do Afinador. O AMC utilizou a lógica e foi quem se enganou mais redondamente. O sol, de facto, pôe-se para aqueles lados, André, mas o Afinador é dado a excessos e a inexatidões, pode ser hiperbólico, ilógico e enganador.

Afinal andou por estas cidades e fotografou estas esculturas. Dão-se alvíssaras ( afina-se o respectivo sino de borla ) a quem acertar no nome das ditas e do escultor das últimas.

02 janeiro 2007



LXIII

Se, ao acordar, te tiverem nascido guelras, procura uma boa piscina para viver. Tu não suportarias viver em plena natureza.



LXIV

Não procures a agulha no palheiro. É preferível que a busques onde a perdeste.

do Caderno de Pensamentos do Sr. Anacleto da Cruz