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Matteo Cigogna, jovem escritor com uma novela e um romance publicados, o último dos quais com sucesso mediano, discutia entediadamente com o seu editor.
- Repito que é essa a frase que eu quero, assim mesmo, sem tirar nem pôr. Não vê que é esplêndida?
- Olhe-se bem para uma sardinha. Olhe-se bem para uma sardinha... - repetia o editor - Isto é lá frase para começar um romance! Já pensou nos leitores que uma frase destas afasta?
- É brilhante. Bri-lhan-te. É o melhor início de romance que se pode imaginar.
- E, depois, isto: Olhe-se e, por uma vez, veja-se a sardinha, demoradamente, atenciosamente, como nunca... Você acha que alguém quer ler isto?
- Isto, como diz, é precisamente o que eu quero escrever.
- Mas você quer contar a história da tal Sara, ou quer escrever um manual de pesca?
- Se ler com atenção verá que, adiante, é Sara que pensa que nunca alguém olhou verdadeiramente para si. É ela que faz a comparação, a imagem é dela: "uma espécie de sardinha".
- E que espécie de mulher se sente sardinha?, pergunto eu. - os olhos do editor trespassavam o corpo mole do escritor - Além do mais, depois de um início desses, ninguém chega a ler essa tal parte, desistem antes, não chegam a comprar o livro.
- Eu gosto da frase, acho que desperta a curiosidade, uma pess...
-Olhe-se bem para uma sardinha. Olhe-se bem para uma sardinha. Olhe-se bem... e esta coisa do atenciosamente, blá, blá, blá, e por aí fora. Ó homem, tenha paciência! Mude lá a porcaria do princípio, risque-o, faça o que quiser, mas arranje-me outro princípio, arranje, de preferência, um princípio que seja bom.
...
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sai hoje aqui
e não se sabe quando
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